Novos rumos do Ministério do Trabalho no enfrentamento do Trabalho Escravo

por Luiz Fernando Plens de Quevedo

Nos estertores do ano de 2017, o Ministério do Trabalho revogou a Portaria n° 1.129, de 13.10.2017, que redefinia os critérios para a caracterização da exploração do trabalho em condições análogas às de escravo. A nova Portaria, n° 1.293, foi um dos últimos atos do Ministro Ronaldo Nogueira, publicada na mesma data em que se publicou a ratificação o seu pedido de exoneração no Diário Oficial de 29.12.2017.

A nova norma da números finais ao embate estabelecido entre o Governo e setores da sociedade, o que desembocou, em 24.10.2017, na suspensão dos efeitos da Portaria agora revogada quando essa sequer ostentava 10 dias de vigência, por meio de decisão monocrática de lavra da Ministra Rosa Weber, em resposta a ação promovida pelo Partido Rede Sustentabilidade.

Pelo novo texto, a caracterização do trabalho em condições análogas às de escravo não mais demanda que o Auditor Fiscal do Trabalho apresente boletim de ocorrência junto ao seu relatório, tampouco é necessário que seja constatada a submissão do trabalhador a trabalho exigido sob ameaça de punição, com uso de coação, mesmo que realizado de maneira involuntária.

Em apertada síntese, todos aqueles critérios utilizados na portaria anterior para a caracterização do trabalho escravo, tais quais, trabalho forçado, jornada exaustiva, condição degradante de trabalho, restrição de locomoção em razão de dívida contraída com o empregador, retenção no local de trabalho, retenção de documentos ou objetos pessoais, agora bastam isoladamente, e não mais se mantém as caracterizações objetivas do que seria o trabalho forçado, a jornada exaustiva e a condição degradante de trabalho.

Nos termos da nova regulamentação do Ministério do Trabalho para a caracterização do trabalho em condições análogas às de escravo, a liberdade de ir e vir e o próprio consentimento do trabalhador em se submeter àquelas condições de trabalho não mais são critérios para se afastar a caracterização do ilícito.

A edição da Lista Suja do Trabalho Escravo, que tanto embaraço causa ao exercício das atividades das empresas investigadas pela prática do ilícito, uma vez que transações comerciais, contratos comerciais e inclusive operações financeiras são, por vezes, canceladas ou antecipadas em seu vencimento, decorrência da presença do nome da pessoa física ou jurídica na referida lista, volta a ter sua edição à competência do corpo de técnicos da fiscalização do Ministério do Trabalho, extinguindo-se a competência privativa que a Portaria anterior, 1.129, outorgara ao próprio Ministro do Trabalho.

Especulava-se que, dos atuais 709 processos para responsabilização decorrentes da submissão de trabalhadores ao trabalho em condições de escravo, aproximadamente 637 desses processos seriam extintos pelos termos da Portaria 1.129. Agora, com a edição da Portaria 1.293, mutatis mutandis, tudo volta a ser como era antes, ou a bem verdade, como jamais deixou de ser, uma vez que a Portaria revogada em 29.12.2017, vigeu por apenas 8 dias e logosuspensa pelo STF.

Renovou-se, de fato, o interesse de todos no assunto, bem como os movimentos do Ministério do Trabalho por avançar na busca da punição daqueles que incorrem no ilícito. Deve-se avançar e verdadeiramente surgir, agora, o interesse de toda a sociedade em conhecer e saber que de todo o bem que a fiscalização busca, sempre há abusos e excessos, principalmente na responsabilização daqueles que, muitas vezes, não detinham ciência de que eventual mal feito ocorria na cadeia produtiva inserida no seu negócio. Deve-se, sempre, saber-se separar o joio do trigo.

Decisão do STF suspende o andamento das Reclamações Trabalhistas de caminhoneiros

por Luiz Fernando Plens de Quevedo

Há tempos a Lei 11.442/2007 é objeto de discussão nos Tribunais Trabalhistas, decorrência das limitações impostas pela Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho – TST, quanto à terceirização da atividade fim e a regulamentação do transporte rodoviário de cargas por conta de terceiros sem a caracterização do vínculo de emprego, por meio dos Transportadores Autônomos de Carga – TAC e, das Empresas de Transporte Rodoviários de Cargas – ETC. Alheio à previsão legal, os Tribunais Trabalhistas, por vezes divididos, muitas vezes unânimes, faziam ouvidos moucos à Lei e aplicavam, indistintamente, a Súmula 331 do TST, para descaracterizar a contratação nos termos da Lei 11.442/2007 e, tratando os tipos contratuais previstos na norma como se terceirização fossem, declarar o vínculo de emprego em razão da terceirização da atividade fim.

Ocorre que a Lei 11.442/2007 socorre, preferencialmente, as Transportadoras, seja para o exercício e organização da sua atividade regular, seja para dar maior dinamismo e fluidez nas hipóteses em que um maior número de movimentação de carga seja exigido. A ausência da relação de emprego entre as partes celebrantes dos contratos previstos na Lei é expressa – “as relações decorrentes do contrato de transporte de cargas de que trata o art. 4º desta Lei são sempre de natureza comercial, não ensejando, em nenhuma hipótese, a caracterização de vínculo de emprego.”

Ainda assim, os Tribunais Trabalho aplicam a Súmula 331, TST, em objetivo detrimento da Lei 11.442/2007. Há Tribunais Regionais, inclusive, nos quais o desprestígio à Lei 11.442/2007 é unânime. No TST a matéria é controvertida.

Agora, após 10 anos de vigência da Lei de transporte rodoviário de cargas por conta de terceiros e mediante remuneração, a Confederação Nacional do Transporte manejou Ação Declaratória de Constitucionalidade ao Supremo Tribunal Federal – STF, a questionar a efetiva constitucionalidade da Lei 11.442/2007, especificamente quando prevê a ausência do vínculo de emprego e a validade dos contratos.

A ação foi distribuída ao Ministro Roberto Barroso que, em decisão de caráter cautelar proferida no dia 19.12.2017, publicada em 27.12.2017, determinou a suspensão imediata de todos os processos que envolvam a aplicação dos artigos 1º, caput, artigo 2º, parágrafos 1º e 2º, artigo 4º, parágrafos 1º e 2º e artigo 5º, caput, da Lei 11.442/2007, até que a Ação Declaratória de Constitucionalidade seja julgada, determinando-se rápida inclusão do processo em pauta ao Plenário do STF, para ratificação da cautelar e posterior julgamento do mérito.

Dessa forma, todas as ações nas quais se questiona a aplicação da Lei 11.442/2007, aquelas nas quais são revisitados os contratos celebrados com Transportadores Autônomos de Carga – TAC – ou das Empresas de Transporte Rodoviários de Cargas- ETC, especificamente quando os contratos são questionados quanto à sua validade em alternativa ao vínculo de emprego, devem ter a tramitação suspensa, até que a matéria seja decidida pelo STF. São ações que, em regra, tramitam perante a Justiça do Trabalho.

O tema em discussão é importantíssimo e não se resolve quando a Reforma Trabalhista previu de forma expressa a possibilidade de se terceirizar a atividade fim. Trata-se de tema que, julgado, apresentará a visão do STF sobre temas correlatos, como a própria prevalência da Lei perante as Súmulas, o que não se deveria discutir, mas é realidade nos Tribunais Trabalhistas.